Tragédia aérea

Índia busca respostas para desastre que matou, ao menos, 265 pessoas

Avião da Air India cai com 242 pessoas logo após decolar, atinge alojamento de médicos e explode. Apenas um ageiro sobrevive e sai caminhando. EUA, Canadá e Reino Unido ajudarão nas investigações

A cauda do avião do Air India dentro do alojamento dos médicos, em Ahmedabab: pedido de socorro pouco antes da queda  -  (crédito:  AFP)
A cauda do avião do Air India dentro do alojamento dos médicos, em Ahmedabab: pedido de socorro pouco antes da queda - (crédito: AFP)

A Índia comandará a investigação para determinar as causas de uma das maiores tragédias da história da aviação e contará com a ajuda de especialistas dos Estados Unidos, do Reino Unido e do Canadá. Às 13h38 desta quinta-feira (12/6) pelo horário local (5h08 em Brasília), o avião Boeing 787-8 Dreamliner com 242 pessoas a bordo — 230 ageiros, dois pilotos e 10 tripulantes — caiu quatro minutos depois de decolar do aeroporto de Ahmedabad, no oeste da Índia, em direção ao Aeroporto de Gatwick (em Londres).

Era hora do almoço, e o refeitório de um alojamento de médicos, no bairro de Meghaninagar, a poucos quilômetros do aeroporto, estava lotado. "Metade do avião se chocou contra o prédio residencial onde moravam médicos com suas famílias. O nariz e a roda dianteira bateram no prédio da cantina", afirmou à agência Presse (AFP) Krishna, um médico que não quis divulgar o nome completo. 

O britânico Vishwashkumar Ramesh, de 38 anos, único sobrevivente entre os ocupantes do avião da Air India, escapou milagrosamente e saiu andando. Um vídeo gravado por moradores de Ahmedabad mostra a aeronave perdendo altitude rapidamente, minutos depois da decolagem, e explodindo em meio às casas. 

John Cox, piloto aposentado e CEO da Safety Operating Systems (em St. Petersburg, Flórida), afirmou ao Correio que ainda é muito cedo para determinar as causas do acidente. O vídeo da queda do avião, viralizado nas redes sociais, levou especialistas a especularem sobre o correto acionamento dos flaps pelos pilotos. "O vídeo não mostra uma conclusão sobre o posicionamento dos flaps. Consequentemente, temos dúvidas, não respostas definitivas", disse. Os flaps são estruturas articuladas, dispostas sobre a asas, que auxiliam na sustentação do voo.

Outra possibilidade levantada envolveria a falha dos dois motores ao mesmo tempo. "Essa hipótese é muito improvável. As turbinas são muito confiáveis. Também não houve relato de problemas de combustível no aeroporto, nem de colisão com pássaros", assegurou Cox. Por sua vez, Ben Berman — ex-piloto de companhia aérea e chefe de grandes investigações do Conselho Nacional de Segurança nos Transportes dos EUA — itiu à reportagem que "algo realmente ruim ocorreu segundos depois da decolagem". "Ao olhar os vídeos, a rolagem da decolagem, a rotação e os primeiros momentos da subida me parecem normais. Isso sugere que os flaps estavam estendidos, pelo menos até certo ponto, e havia bastante empuxo para começar o voo. Então, o avião perde energia, nivela e começa a mergulhar. Uma falha nos dois motores logo após a decolagem poderia explicar essa trajetória", comentou.

Apoio às famílias

Até o fechamento desta edição, havia números diferentes sobre as vítimas: entre 265 e 290. Kanan Desai, responsável pela polícia de Ahmedabad, informou que 265 corpos foram enviados ao hospital, o que significa que 24 pessoas morreram em solo. A Air India divulgou nota em que oferece "as mais profundas condolências às famílias dos mortos". "Nossos esforços estão focados inteiramente nas necessidades de todos os afetados, suas famílias e entes queridos."

A companhia também mobilizou assistentes sociais para prestar ajuda psicológica aos parentes, e médicos convocaram familiares para coletarem amostras de DNA que ajudarão na identificação dos cadáveres. Ela pagará 10 milhões de rúpias indianas (ou R$ 642 mil) a cada família que perdeu um ente querido. 

Entre os ageiros mortos no pior acidente da história da Índia, está Vijay Rupani, ex-ministro-chefe do estado de Gujarat, onde se situa Ahmedabad. As autoridades indianas itiram que somente farão um balanço conclusivo depois de realizarem os testes de DNA em todos os corpos, a maioria carbonizada durante a explosão. 

Segundo a Direção Geral da Aviação da Índia, os pilotos emitiram um código de emergência "Mayday" para a torre de controle de tráfego aéreo durante a decolagem. O jornal The Indian Express divulgou que a mensagem de socorro do piloto chegou à torre, que tentou contatos sucessivos com a tripulação, mas não obteve resposta. "A tragédia em Ahmedabad nos chocou e entristeceu. É devastador para além das palavras", declarou o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi.

Repórter do Divya Bhaskar, jornal de Ahmedabad, Dhruv Sanchaniya chegou ao local da queda meia hora depois. "A cerca de um quilômetro, o trânsito estava parado. O pânico transformou a estrada em estacionamento. A 500m, o cenário era surreal: ambulâncias enfileiradas, bombeiros encharcados de suor e fuligem. Médicos, policiais, assistentes sociais e funcionários de hospitais corriam, ajudavam e choravam", relatou ao Correio.

"Havia escuridão, destroços em chamas e cadáveres. O fedor da tragédia estava por toda a parte. Não era possível olhar para algum lugar sem testemunhar a dor. Não era só uma cena, mas algo que se sentia nos ossos." Sanchaniyta disse que, ao visitar hospitais, viu pais com mãos trêmulas e chorando. "Alguns rezavam, outros tinham perdido a esperança." 

O Correio também falou com Akash Vatsa (leia Depoimento), um morador de Nova Délhi que estava no avião e desembarcou em Ahmedabad pouco antes de a tragédia ocorrer. No trajeto inicial da aeronave, ele gravou vídeos, dentro do Boeing 787-8 Dreamliner, e apontou problemas com o ar-condicionado, com os monitores e com os interfones dispostos em cada poltrona. "Talvez não sejam problemas incomuns. Muitas pessoas dizem que o ar-condicionado nada tem a ver com o desastre. No entanto, muitas pessoas estavam sufocando no voo, inclusive, eu e meus pais, idosos."

 

Depoimento // "Eu estava no mesmo voo duas horas antes"

"Eu embarquei no voo AI423, de Nova Délhi para Ahmedabad, nomesmo Boeing 787 Dreamliner. Deixei a aeronave por volta das 11h50 (3h20 em Brasília), duas horas antes da tragédia. O avião ou a fazer o voo AI171 entre Ahmedabad e Londres. Como eu retornaria a Nova Délhi no mesmo dia, não despachei a bagagem. Tive uma reunião perto do aeroporto. Eu estava dentro do táxi, quando comecei a conversar sobre a minha agenda e coloquei o celular para carregar. Publiquei alguns vídeos de problemas que vi no avião, além de fotos do voo, nas minhas redes sociais. Ao checar os stories no Instagram, vi a mensagem de um amigo que me perguntou se eu estava bem e relatando a queda do avião. Fiz uma busca no Google e soube do desastre. Fiquei traumatizado e chocado.

Meus anjos da guarda me salvaram. Estou processando as emoções. Tenho chorado pelas pessoas que morreram nessa tragédia. A vida é muito preciosa. Eu apenas rezo pelas almas das vítimas e por suas famílias. Também rezo em agradecimento pelo fato de eu e os outros ageirosdo voo entre Nova Délhi e Ahmedabad estarmos vivos. Pela graça de Deus, eu estou em minha casa."

Akash Vatsa, morador de Nova Délhi. Viajou no mesmo avião para Ahmedabad e desembarcou pouco antes de a tragédia ocorrer

 

Eu acho...

"Nada está descartado. Os investigadores olharão para todas as possibilidades, inclusive falha humana. O 787 tem estado em operação desde 2011. Este é o primeiro acidente com mortes envolvendo a aeronave. Claramente, é um avião seguro. Há milhares deles voando por muitas companhias aéreas ao redor do mundo."

John Cox, piloto aposentado e CEO da Safety Operating Systems (em St. Petersburg, Flórida)

  • Socorristas diante dos destroços do Boeing 787
    Socorristas diante dos destroços do Boeing 787 Foto: Sam Panthaky/AFP
  • Familiar de tripulante chora ao receber a notícia
    Familiar de tripulante chora ao receber a notícia Foto: AFP
  • A cauda da aeronave exposta sobre os escombros do abrigo de médicos e estudantes de medicina, em Ahmedabad, no oeste da Índia
    A cauda da aeronave exposta sobre os escombros do abrigo de médicos e estudantes de medicina, em Ahmedabad, no oeste da Índia Foto: afp
postado em 13/06/2025 06:00
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